31 de julho de 2025

ESPECIAL DE FIM DE SEMANA. Em entrevista Domingos Dutra (PT-MA) avalia trabalho a ser realizado pela CPI do sistema carcerário; Deputado alega que caos nos presídios influencia na segurança pública. <BR>

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Por admin
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(Brasília-DF, 07/09/2007) A Câmara instalou no final de agosto a CPI do Sistema Carcerário. A iniciativa pretende fazer um mapeamento dos problemas do sistema prisional brasileiro e apontar soluções e políticas para o setor. O deputado Domingos Dutra (PT-MA), que foi um dos autores de requerimento da CPI, foi nomeado relator da Comissão.



Em uma entrevista especial, o parlamentar, que é formado em Direito, discorre sobre os principais problemas das penitenciárias no país e explica como será o trabalho da CPI. “Um dos fatos que temos certeza que é grave é a superlotação. É evidente que dessa superlotação decorrem vários outros problemas: presos de diferentes regimes misturados, dentre eles mulheres, menores, albergados; presos provisórios misturados com presos respondendo inquéritos. Outro ponto é a facilitação da entrada de armas, drogas, celulares”, revela Domingos Dutra.



“Estamos convidando o IBGE e o IPEA para os debates, pois são dois institutos que tem pesquisas sobre perfil da criminalidade do país. Esse perfil já está projetando o tipo de preso que vamos encontrar nos presídios e poder pensar que política é preciso aplicar em cada local”, informou ainda o parlamentar. Dutra tem o intuito de verificar as peculiaridades de cada região para poder sugerir políticas mais efetivas.



O relator alega que vai dividir em quatro etapas o trabalho da comissão: primeiro avaliar diagnóstico atual do sistema, em seguida fazer visitas aos presídios, ouvir ministros e governadores sobre as políticas para o setor e por fim a elaboração e votação do relatório. Apesar da complexidade e vastidão do tema Domingos Dutra espera concluir o trabalho em 120 dias, prazo regimental da CPI.



Segundo o petista a Comissão tem ainda o importante trabalho de colocar na agenda do país a discussão sobe humanização das cadeias e ressocialização dos presos. “A sociedade tem que perceber que não há solução para segurança pública, se não houver mudança no modelo penitenciário”, opina. Segue abaixo a entrevista completa.



Qual foi a motivação para a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito sobre sistema carcerário brasileiro?



O motivo da criação são denúncias decorrentes do caos existente no sistema penitenciário do país, que apresenta fugas, crime organizado, maus tratos dos presos. Como toda CPI precisa ter um fato determinado, vamos investigar na Comissão a superlotação dos presídios e todas as conseqüências dela decorrentes. Vamos investigar das facções criminais dentro dos presídios. Queremos investigar a existência de presos que já cumpriram pena, e mesmo já tendo o direito de estar livres continuam presos. Queremos saber a situação das mulheres encarceradas, e seus filhos, e a saúde dos presos. Esses são os temas principais da CPI.



Tendo em vista a complexidade e multiplicidade de problemas referentes ao tema como a CPI pretende trabalhar?



Eu apresentei um cronograma de trabalho aprovado em Comissão, que constitui em quatro etapas dentro dos 120 dias de funcionamento da CPI. Na primeira etapa queremos fazer o diagnóstico do sistema carcerário brasileiro, ouvindo especialistas das mais diversas áreas e pessoas que trabalham no sistema como secretários dos estados, funcionários dos departamentos de sistema prisional, entre outros. Na segunda etapa vamos fazer visitas a penitenciárias, delegacias, casas de custódia. Na terceira etapa queremos ouvir as autoridades que definem as políticas, como os governadores e ministros. E na quarta etapa apresentar o relatório. Já foram aprovados vários requerimentos de audiências, que estou organizando dentro desta sistemática e na próxima semana já começaremos a ter debates. Além da radiografia do sistema eu acho que maior contribuição da CPI é produzir sugestões tanto para o Congresso, quanto para os poderes executivos, federal e estadual.



O que se pode avaliar nesse primeiro momento da situação do sistema prisional?



Um dos fatos que temos certeza que é grave é a superlotação. Logo que a CPI foi instalada surgiu uma tragédia lá em Ponte Nova (MG) onde 25 presos morreram queimados em uma cela. Estivemos lá e constatamos a superlotação, pois uma delegacia que era para ter 70 presos tinha 185. É evidente que dessa superlotação decorrem vários outros problemas: presos de diferentes regimes misturados, dentre eles mulheres, menores, albergados; presos provisórios misturados com presos respondendo inquéritos. Outro ponto é a facilitação da entrada de armas, drogas, celulares. E o que vimos no local, me parece que é a situação geral do Brasil. É essa realidade dramática que queremos radiografar e atualizar. Já existem estudos, pesquisa feitas sobre o tema que vai servir de subsídio para os nossos trabalhos e apontar sugestões. Vamos também visitar experiências positivas de penitenciárias e de organizações da sociedade civil, aqui e fora do país.



A partir dos dados que já existem é possível fazer algum diagnóstico prévio sobre a situação no Nordeste?



Essa CPI se trabalhar com afinco vai pode identificar melhor a realidade de cada região. Eu creio que as situações são diferentes de acordo com cada realidade. Nas capitais mais populosas como o São Paulo e Rio de Janeiro a situação é bem grave, principalmente pela influencia do tráfico organizado. No Nordeste a situação é diferente. Em Pernambuco, por exemplo, vemos que os homicídios são recorrentes mas em um outro contexto, que não é do crime organizado. Na região Sudeste podemos notar muitos crimes contra o patrimônio. No Norte o tráfico de drogas é grande também. No Nordeste tem a questão da pistolagem. Portanto a CPI é capaz de diagnosticar o tipo de crime recorrente nas diferentes regiões. Estamos convidando o IBGE e o IPEA para os debates, pois são dois institutos que tem pesquisas sobre perfil da criminalidade do país. Esse perfil já está projetando o tipo de preso que vamos encontrar nos presídios e vai ajudar a pensar que política é preciso aplicar em cada local.



Vai existir algum trabalho sobre financiamento do sistema?



Um dos focos da CPI é justamente definir os custos desse sistema. Detectar quanto custa a manutenção do preso hoje para a sociedade. Averiguar se os recursos estão sendo aplicados, e se há corrupção. E também determinar responsabilidades dos governos estaduais e do federal. A CPI vai tentar ver também onde os recursos são mais bem aproveitados, onde o preso custa menos para a nação e que lugares existem experiências promissoras, que ressocializem presos. Um dos objetivos da CPI é colocar esse tema na agenda e dialogar com a sociedade que a pessoa que comete crime primeiro precisa ser julgado, depois ser alocado em lugar apropriado, mas é obrigação do estado ressocializa-lo. Às vezes a população acha que cidadão condenado deve ser tratado como bicho. E qualquer cidadão é sujeito a cometer um delito. E há mil razões para a pessoa transgredir a Lei. À vezes é por meio de grupos criminosos organizados, mas a maioria dos delitos são fortuitos. E essas pessoas não podem ser tratadas da mesma forma. E hoje vemos uma mistura de pessoas que cometeram os mais diferentes delitos, cumprindo pena na mesma penitenciária. A sociedade tem que perceber que não há solução para segurança pública, se não houver mudança no modelo penitenciário.



O judiciário também tem um papel importante no bom funcionamento deste sistema. A CPI pretende avaliar a atuação do judiciário também?



A intenção é que após a conclusão da CPI uma de suas conseqüências seja a proposição legislativa. Mas é preciso haver uma articulação de ações, onde o papel do judiciário e do Ministério Público é muito importante. Há situações onde o cidadão que cometeu o delito pode cumprir uma pena alternativa, mas às vezes o juiz prefere determinar uma pena alta e mandar para cadeia. Essa pena alternativa poderia ser usada em situações em que delito não tenha sido tão grave. Outro ponto que precisa reforçar é presença do Ministério Público para fiscalizar e acompanhar o sistema prisional. No caso de rebelião em Minas Gerais, por exemplo, um dos mortos estava com alvará de soltura pronto há um mês. Mas o alvará só chegou depois dele ter sido morto. O MP também poderia averiguar a presença de menores em prisões. Esses dois órgãos são partes integrantes do sistema e precisamos também melhorar as suas estruturas de trabalho, com mais promotores e juristas, e condições estruturais para que ações funcionem.



A CPI quando coloca esse tema na agenda é para melhorar as políticas e criar uma priorização sobre esse sistema que é parte integrante da sociedade. O Estado tem que assumir a responsabilidade de corrigir e ressocializar aquele cidadão que transgrediu a Lei, do contrário a sociedade paga caro, as famílias padecem e o sistema não conseguem reintegrar aqueles que cometeram delitos.



( por Liana Gesteira Costa com edição de Genésio Araújo Junior)