Especial do Fim de Semana.
O deputado Severiano Alves( BA), líder do PDT, revela em entrevista a nova maneira de fazer política do partido que vem conquistando espaço importante nos estados do Nordeste e discute sobre o projeto que cria o Fundo de Educação Básica.

( Brasília-DF, 02/12/2005) O líder do PDT, o deputado baiano Severiano Alves, em entrevista para o site fala sobre educação, uma das bandeiras do partido e revela um novo perfil político adotado pelo partido nos últimos tempos. Segundo ele o PDT vem conquistando espaço na política nacional por instaurar uma nova forma de fazer política, se desfazendo do embate meramente ideológico, mas sem perder a coerência.



O partido, que hoje tem representantes de seis estados nordestinos na Câmara Federal, pretende ampliar sua atuação nas eleições de 2006 e lançar candidato próprio para a presidência da república. O líder Severiano Alves afirma que o senador Cristovam Buarque (DF) e o senador Jefferson Perez (AM) são os nomes mais cotados para candidatura.



Os principais líderes do PDT travaram uma longa luta na defesa das questões trabalhistas no país, assumindo como bandeira forte do partido, que foi fundado há 25 anos. Na área da educação, o PDT propõe um ensino integrado e em tempo integral para população, modelo idealizado por Brizola. O deputado Severiano Alves acredita que educação é um investimento primordial para o desenvolvimento do país e revela em entrevista o processo de elaboração da PEC para criação do Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb).



“Se eu não voltar eleito no próximo mandato para mim este mandato já teria justificado minha presença no Congresso Nacional, por dar ao país uma emenda constitucional que permite melhorar a vida das pessoas”, declara o deputado sobre o trabalho realizado na comissão do Fundeb, a qual ele preside.





Política Real – Qual a importância da implantação do Fundo de Educação Básica para o país?



Severiano Alves – A educação é hoje o melhor investimento que qualquer nação possa fazer. Os países que investiram em educação, como os Tigres Asiáticos, deram a prova de que não podemos hoje crescer sem educação. O Japão e a Coréia, por exemplo, que saíram arrasados da guerra resolveram retomar o desenvolvimento e crescimento da nação e investiram em educação. A escolaridade na vida do trabalhador é um fato importante. Cada ano de escolaridade do cidadão aumenta sua renda per capita em 16%. Isso é um dado científico. Entendemos que essa emenda constitucional que cria o Fundo de Educação Básica é importante porque traz uma possibilidade de fazer educação no país com mais distribuição justa das atividades. Hoje só atendemos de forma obrigatória a educação fundamental. Na medida que nós obrigamos, nós damos a qualquer cidadão o direito de exigir do poder público uma vaga. Mas quando ela não é obrigatória, o município diz: ‘Eu sou responsável mas não tenho como fazer uma creche. Ou seja, devo não nego pago quando puder.’ Isso nós queremos acabar. Queremos universalizar a educação, englobando educação infantil, educação fundamental e ensino médio, esse é o ciclo da educação básica.



Nos países desenvolvidos qualquer cidadão que tenha uma formação básica pode exercer qualquer atividade. No Brasil é diferente. O cidadão já não fez educação infantil porque não teve a oferta da vaga do poder público e faz uma educação fundamental sem nenhuma qualidade, agora que está um pouco melhor. No curso médio ele apreende apenas uma formação de assuntos gerais. Ao contrário de outros países que a educação básica vem sendo profissionalizada desde a educação fundamental. Terminado o ciclo de educação básica ele é um profissional, ele vai para universidade se quiser. Aqui no Brasil é diferente, ele vai para a universidade para aprimorar seus conhecimentos que não teve na educação básica. E aí o pior: ele volta para exercer uma profissão do segundo grau.





Com o projeto do Fundeb existe a possibilidade de melhorarmos a qualidade do ensino e os currículos das escolas. Existe a garantia de um piso do valor per capita de cada aluno matriculado, em que o município vai vincular em torno de 700 reais. Então vamos dar um salto. Isso daria um valor mensal de 60 reais por aluno, diferente de 1995 que esse custo era de 3 reais. Então dá para fazer uma educação de razoável qualidade. E agora eu acho que o ensino vai deixar de ser de conhecimento gerais, que prepara o aluno só para o vestibular para ser um ensino profissionalizante, um ensino de formação básica. Depende agora dos municípios, da fiscalização do poder público e da boa vontade dos dirigentes do governo federativo. Esse eu acho que é um ponto fundamental.



PR – O Ministério Público vem acumulando uma série de processos sobre os estados brasileiros, principalmente os do Nordeste, por irregularidades na área de educação. Como você avalia esse fato?



Severiano Alves – Essas demandas no judiciário, provocadas pelo Ministério Público, têm um pouco de equívoco por exigir que o município ofereça a creche ou a pré-escola. Você tem que considerar que o artigo 211 da Constituição diz que o município é obrigado a gastar 25% no mínimo com educação. A mesma coisa com o Governo do Estado. E a União é obriigada a gastar 18%. Só que gasta isso de forma irregular. Pode ver que na prestação de contas eles maquiam os gastos. Por exemplo, constróem um estádio de futebol, com dinheiro da educação. Educação é um salário decente para o professor, escola, biblioteca, laboratório. Isso que é educação na essência. Quando eu disse que há um equívoco eu quis dizer que hoje não podemos exigir do município a oferta da vaga da Creche. Porque está escrito no artigo 211 que apenas a educação fundamental é de natureza obrigatória. A educação infantil é de ‘responsabilidade’. Então há uma diferença entre ser obrigado e ser responsável. Quando eu sou obrigado eu tenho que cumprir. Além da obrigatoriedade constitucional há hoje o recurso definido.



Agora com a emenda é diferente, pois estamos também universalizando a oferta de vagas na pré-escola e para a creche, de natureza obrigatória. Estamos garantindo em quatro anos o atendimento da demanda na pré escola e na creche. A demanda hoje de crianças de 0 a 3 anos, de creche é de cerca de 10 milhões de alunos. Vamos atender 50% da demanda. O poder público hoje atende 10%. Com o aporte de mais 200 milhões de reais para o fundo vão poder universalizar o ensino e atender a parte da demanda de creche.



PR – Quais os mecanismos previstos no Fundeb para erradicar essas irregularidades na área de educação?





Severiano Alves – No projeto do Fundeb, nós nos preocupamos com isso e mudamos os mecanismos de fiscalização. Inclusive o Conselho que criamos no Fundef, não era um conselho paritário. Era um conselho muito resumido. Agora criamos um conselho reunindo toda sociedade organizada para fiscalização dos recursos. Vão fazer parte desse conselho: os alunos, os pais, os professores, o poder público, o ministério público, ou seja, toda a sociedade organizada vai fazer parte. O presidente deste conselho vai ser eleito, não é mais um conselho arrumado na ante-sala do prefeito. Com este conselho agora vamos possibilitar a transparência, o cidadão vai ter acesso ao dinheiro, as contas da prestação desse dinheiro.



PR – Você comentou que a Constituição de 1988 deixou de fora a educação infantil. Como você analisa este fato?



Severiano Alves – Eu tenho dito que o constituinte de 1988 não tinha noção da importância da educação infantil, tanto que eles propõem priorizar a educação fundamental por considerar que era a área mais vulnerável da sociedade brasileira. No universo de 50 milhões de matrículas envolvendo educação infantil, fundamental e média eu diria que 30 milhões de matrículas são do ensino fundamental. Quase dois terços dessas matrículas. Outra situação que o constituinte deve ter enxergado é que as pessoas saiam do ensino fundamental sem saber ler ou escrever, sem saber falar, sem saber interpretar texto. Ou seja, ele não era considerado uma pessoa com preparo intelectual para complementar as informações no 2 º grau. E terminava o 2º grau numa situação muito decadente. Foi aí que apareceu a industria dos cursinhos. Então acho que um erro do constituinte foi deixar de fora a parte mais sublime da educação, a essência, a alma, que é a formação do berço. Essa fase onde a criança começa a ter o contato com os valores éticos, familiares, sociais, enfim ele começa a se adaptar a vida. É a fase da curiosidade. A fase de formar os conceitos. È a parte mais sublime. Por isso que eu disse ontem que se eu não voltar eleito no próximo mandato para mim este mandato já teria justificado minha presença no Congresso Nacional por dar ao país uma emenda constitucional que permite melhorar a vida das pessoas.



PR – Qual o impacto deste projeto para o Nordeste?



Severiano Alves – O impacto é muito forte para o Nordeste primeiro na questão salarial do professor, porque nós vamos sair de um piso salarial mínimo para quase o dobro. Nós vamos assegurar para o Nordeste uma remuneração de piso salarial talvez igual ao valor que eles ganham hoje com todas as vantagens do cargo. Isso significa dizer que vai dobrar o salário dos professores do Nordeste e isso significa um aumento na renda, na qualidade de vida e para auto-estima do cidadão.



Em relação ao investimento nós vamos sair de um investimento nacional do país de 32 bilhões para 50 bilhões. Isso muda alguma coisa. Em quatro anos vamos mudar um pouco essa realidade brasileira. Acho que esse é o impacto, nós vamos crescer o número de matrículas, melhorar a qualidade e criar, além da renda para professores, um desenvolvimento em curto prazo.



PR – Sobre o salário de professores, o Palocci ontem sugeriu que o Fundeb não tentasse instituir um piso nacional porque poderia prejudicar os municípios mais pobres que não teriam como complementar o valor dos salários. Como essa questão do piso salarial está prevista no projeto do Fundeb?



Severiano Alves – O conselho do Palocci não foi aceito, até porque era uma opinião que ele estava dando e ele até admitiu que não teria nenhum impacto para União. Mas ele não conhece a realidade do Nordeste. Ele foi prefeito de Riberão Preto, e não foi prefeito de Saúde, na Bahia, como eu fui. A realidade dele é muito diferente. A maior renda salarial do Brasil da educação básica é de Campinas. Chega a ser humilhante. O piso salarial de Campinas é 2600 reais e o piso no Nordeste é de 300 reais quando se junta as vantagens do cargo chega a 580 reais. Então o conselho do Palocci não nos agradou. No relatório já consta a criação do piso do salário. A lei complementar vai definir os valores. Mas vamos aproveitar a disponibilidade dos recursos que estão reservados na própria emenda para salário dos professores.



PR – O PDT sempre levantou a bandeira da educação. Como você vê essa questão de estar presidindo uma comissão tão importante para área, principalmente sendo um nordestino?



Severiano Alves – O PDT tem 25 anos de criação, mas tem líderes que se dedicam a questão trabalhista há mais de 70 anos. Jango, Brizola, todos os líderes do passado cultivavam essa bandeira. Diferente de partidos que surgiram do impacto entre capital com o trabalho, como é o caso do PT, que surgiu dos embates nas fábricas. Nós surgimos da construção dos direitos dos trabalhadores. Então nós consideramos esses direitos. E o Brizola, quando foi governador, entendeu, como bom político que foi, eu diria até estadista, que para crescer tinha que se educar. E ele idealizou o modelo que hoje nos pregamos no partido que é a educação integrada durante um período integral. Então se você integra educação infantil, fundamental e média, você vai tirar as crianças da rua, você vai oferecer um bom ensino, desde esportes até uma profissão. Esse tipo de modelo eu espero pode implantar um dia, seja eu ou outro dirigente do PDT. Então essa é uma bandeira que o PDT não abre mão e que é para mim talvez mais valiosa.



PR – O PDT é considerado um partido de porte médio e particularmente cresceu muito no Nordeste. Qual a meta para as eleições de 2006 no Nordeste?



Severiano Alves – O PDT hoje está muito forte no Nordeste. Ele dirige a prefeitura da terceira maior capital do país, que é Salvador , com o prefeito João Henrique. No Maranhão somos prefeito da capital. Alagoas nós temos o governador. Nós temos representação no Congresso de quase todos os Estados. Temos do Ceará, Alagoas, Sergipe, Bahia, Rio Grande do Norte e Maranhão. Mas na próxima eleição nós vamos estar seguramente com todos os estados aqui na Câmara Federal. Nós temos um problema, pois pretendemos lançar candidatura própria para Presidência da República. Temos dois nomes: o senador Cristovam Buarque e o senador Jefferson Perez. Mas temos problemas com alianças bem definidas, como no estado do Paraná. Vamos precisar fazer alianças também no Maranhão, em Alagoas, em Sergipe e na Bahia.



PR – A Bahia tem uma história de oligarquia política, mas é um Estado que tem um desenvolvimento crescente. Como você analisa esta situação?



Severiano Alves – Eu acho que nós soubemos conviver com a oligarquia e o PDT inaugurou um novo jeito de fazer política, convivendo com a oligarquia. Nós saímos do campo do ataque pessoal, do campo das denúncias e fomos para o campo das idéias. Fomos para as ruas, conversar com o povo e mostrar que uma outra alternativa era muito mais viável do que permanecer com a oligarquia. E surgiu a possibilidade de ganhar a eleição. Nós saímos do campo do embate ideológico e fomos para o campo das idéias, do debate, do racional. O povo acreditou que era uma nova fase e hoje o prefeito Henrique está lá com 80% de aceitação, com uma boa avaliação. Com o uso da razão nós criamos outras alternativas. Quando nós fazemos uma obra no centro, fazemos duas na periferia, por isso ele está sendo bem avaliado tanto no centro como na periferia. E esse um exemplo de como conviver e separar, usando o campo das idéias.



PR – Existe essa postura em outros estados? È um projeto nacional do partido?



Severiano Alves – Alagoas também vem adotando este modelo, de discutir mais a política no campo racional. Nós do PDT estamos com esse papel. É um projeto nacional. Outra coisa que fortalece na credibilidade é não fugir a nossa coerência. O PDT não é manobrado por grandes partidos, somos um partido médio com respeitabilidade muito grande. Nós não estamos aqui comandados pelo PFL ou pelo PSDB, nós somos coerentes. É um projeto para ter credibilidade nacional. Até que nos convença que nossa posição é ruim nós acreditamos, mantendo nossa coerência. Nós achamos que aposentados não devem pagar mais previdência do que pagam durante 40 anos. Nós achamos que deve ter critérios para privatizar o patrimônio nacional, não podemos jogar fora o que construímos em 500 anos. Não é radicalismo, é coerência. Até votamos com o governo, quando o projeto é bom. Nós votamos na biossegurança porque achamos que a ciência precisa avançar. Isso significa independência, coerência e oposição no campo institucional, não no campo do poder.



PR – Como o PDT encara esse momento de cassação de deputados?



Severiano Alves – Esse é o único momento em que o PDT não fecha a questão. Porque entendemos que a cassação de parlamentares é um ato muito pessoal do parlamentar. O que pedimos é que o parlamentar veja com muita clareza os padrões que nós defendemos. Não obrigamos ninguém a votar sim ou não, deixamos a vontade. Agora o que recomendamos é uma apuração rigorosa do caso, agir com muitos critérios e não votar com emoção. Nós vamos votar com o rigor da lei. Eu acho que se tem culpa, se o conselho de ética apontou, é culpado. Eu não acho que o conselho de ética tenha alguém irresponsável para dar um parecer equivocado. Como líder da bancada eu não reuni ninguém para falar como votar. Eu deixo livre. Mas nossa posição é apuração com rigor e seriedade. Mas acho que está demorando demais, ta criando palanque. Acho que já temos fatos suficientes para punir os culpados. Mas temos que continuar acreditando que a regra é dos bons políticos. A exceção constitui o erro. Nós temos que punir a exceção. Minha tese tem provas. O Congresso Nacional tem 513 deputados e 81 senadores A exceção foi constituída de 26 acusados. Que manchou a regra. Pode ser até que tenha mais culpados, mas ela jamais chegaria a mais de 50 deputados. E isso não é a regra, eles são a exceção. O político tem que defender o mandato. Se você tiver vergonha de ser deputado é melhor deixar política. Eu sou advogado, fui procurador federal durante 40 anos. Hoje estou na vida política e tenho maior orgulho de dizer que sou deputado. Meu orgulho maior é dizer que sou líder da minha bancada, o que construí com muito sacrifício, por isso prefiro honrar isso e defender meu mandato como a coisa mais sublime da minha vida e do meu partido.





( por Liana Gesteira e Genésio Araújo Junior)

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