Especial de Fim de Semana.

O deputado Inácio Arruda (PCdoB-CE), coordenador da Bancada do Ceará na Câmara Federal, revelou o conteúdo das reuniões que tem tido com ministros para discutir obras importantes para o Nordeste; o deputado falou de transposição do São Francisco, da política de desenvolvimento do país e da crise política; criticou a política econômica do governo Lula e a postura do PFL e do PSDB diante da crise e afirmou que PCdoB pode apresentar candidato à presidência nas próximas eleições.

( Brasília-DF, 16/09/2005) Em entrevista exclusiva concedida a Política Real, o coordenador da Bancada do Ceará na Câmara Federal, Inácio Arruda (PCdoB-CE) divulgou o conteúdo das reuniões que tem realizado com ministros na busca por recursos para obras importantes para o seu Estado. As principais obras e o posicionamento dos ministros frente às discussões foram revelados pelo parlamentar em um bate-papo de quase uma hora.





Além disso, Inácio Arruda revelou, em primeira mão, que irá, junto com a Bancada do Nordeste, até o TCU para discutir o progresso da transposição do Rio São Francisco, obra que tem recursos para ser colocada em prática, mas enfrenta restrições legais e ambientais. A reunião acontecerá na próxima quarta-feira, 21, e conta com o apoio do coordenador da Bancada, B. Sá.





O parlamentar falou, ainda, do problema da distribuição de renda para os Estados, da importância das reuniões da Bancada do Nordeste, criticou a política econômica e de distribuição de renda adotadas por Lula e ironizou o interesse da oposição em retirar o deputado Severino Cavalcanti da presidência da Casa. Para Inácio, em nenhum momento os partidos de oposição “estavam preocupados com a ética”. Além disso, criticou o que chamou de palco eleitoral promovido pelo PFL e PSDB no Senado.





Para finalizar, o coordenador falou do futuro do PCdoB em meio a essa crise e afirmou que o partido “pretende continuar na busca de seu objetivo maior que é construir uma sociedade socialista”. Segundo ele, isso pode significar a apresentação de candidato próprio à presidência nas próximas eleições. Confira a conversa abaixo:





Como coordenador da Bancada do Ceará, o senhor vem fazendo uma série de reuniões com vários ministros, para pedir agilidade na execução de algumas obras. Que obras são essas e quais as expectativas que o senhor tem dessas reuniões?





O principal objetivo da retomada de reuniões com os ministros é mostrar a importância do conjunto de obras que estão na ordem do dia para a região Nordeste, especificamente no Ceará, onde tenho a responsabilidade de coordenar a Bancada, e pedir agilidade do governo. Entre elas estão três vias, que são federais e importantíssimas para o Ceará; uma que nos liga à Região Sul, a BR 116, talvez a maior rodovia do nosso país; depois a BR 020, que nos liga à Região Norte, Piauí, Maranhão, Belém e vem até o Distrito Federal e Goiás, e é indispensável para nós; e a BR 102, que nos liga ainda mais ao Norte, Teresina, São Luís do Maranhão. Essas vias são obras federais, que já estão em curso, mas que só com o dinheiro disponibilizado no orçamento, nas emendas de Bancada, elas não serão realizadas. Então é preciso um entendimento do governo federal e discutimos isso com o ministro da área e depois volta a discussão para o Ministério do Planejamento. Exatamente por isso que o Ministro do Planejamento é o mais assediado pelas bancadas, o mais requisitado, porque ele tem a responsabilidade de definir as obras que devem entrar no PPI (Plano Piloto de Investimentos), que vai usar recursos do superávit primário que não estão subordinados à política de contingenciamento. Essas são obras que já estão em curso, que não estão sujeitas a processos de licitação, que já superaram a fase de pedido de licença ambiental, já passaram por todos esses critérios e processos, não tem porque não colocá-las no PPI, para facilitar o andamento dessas obras, que resolvem nosso problema de escoamento, resolve o problema de geração de empregos e que apenas as emendas de bancada não resolvem, porque você consegue R$ 30, R$ 40 milhões, para uma obra de R$ 100 milhões, ela vai continuar parada.





Outra obra importante é a Transnordestina, que sempre está sendo discutida e, ao que tudo indica, ela só terá solução se for colocada no PPI. O ponto positivo é que o ministro do planejamento já aquiesceu e concordou que é importantíssima, afirmou que ela já está no PPI, mas que ainda tem pendências na área ambiental, falta licenciamento em alguns trechos.





Outra obra que está com o mesmo problema e que não está no Ceará, mas estamos lutando por iniciar, é o alargamento da BR 101. Ela está em outros estados, mas é importante para nós também. Ela também está sujeita ao licenciamento ambiental, o ministro a considera importante, decidiu colocá-la no PPI, mas ela não pôde ser iniciada. O Ceará não é o único a defender obras no Nordeste que não beneficiam o Estado imediatamente. Um exemplo é o Piauí, que não será beneficiado imediatamente pela interligação de bacias do Nordeste Setentrional com a Bacia do São Francisco, mas tem tido uma importância muito grande do ponto de vista político. Essa obra chega ao Piauí indiretamente, porque libera bacias de outros estados que fornecem água, de alguma forma, ao estado. Com a sua sabedoria política, o Piauí percebe a importância de apoiar esta obra, mesmo que não seja uma obra que vá até o Piauí, isso demonstra muita sensibilidade política. Essa obra também não tem problemas de contingenciamento de recursos, mas está pendente de autorização do IBAMA, precisa da licença ambiental. Em acordo com o coordenador da Bancada do Nordeste, o deputado B. Sá, nós iremos, na próxima quarta-feira, 21, ao Tribunal de Contas, conversar com o presidente e com o relator que hoje discute a questão da obra de interligação de bacias, para fazermos uma espécie de reforço da importância, da necessidade dessa obra para os Estados de Pernambuco, Ceará, Rio Grande do Norte e Paraíba.





Outro tema que nós insistimos também em discutir é o problema do metrô de Fortaleza, que é uma obra que atinge a região metropolitana inteira e que não está finalizado em outros estados também. Vamos fazer uma audiência publica na Comissão de Desenvolvimento Urbano para tratar desta matéria com as quatro capitais que enfrentam o problema: Belo Horizonte, Salvador, Recife e Fortaleza, porque essas obras podem estar, e algumas já estão, no PPI, mas carecem de um plano para conclusão da obra. E os planos têm sido questionados, propostas têm surgido, no caso de Fortaleza chegaram a sugerir que se voltasse ao trem antigo, o que representaria um retrocesso muito grande para os Estados. O Brasil perde com propostas como essa, porque significaria andar em marcha ré e nós precisamos buscar sempre dar um passinho mais pra frente. Essa obra tem problemas, temos discutido intensamente, porque algumas delas dependem de empréstimos externos, o governo atual preferiria que elas fossem feitas com recursos próprios e eu também acho que seria mais correto, mais justo. Só que esses empréstimos já foram tomados e não temos como recuar neles, então há a necessidade de garantir a conclusão dessas obras. Seria importante também para o governo federal, embora as obras estejam sendo executadas pelos Estados. É o típico caso em que, se der certo, foi feito pelo Estado, se der errado, foi o governo Lula. A minha opinião é de que o governo tem de estar muito atento a isso e buscar soluções que sejam ajustadas também ao interesse do Ceará, não podemos fazer de conta que não existe o Estado e o seu governo, mas também devemos compatibilizar essa questão com o interesse da população. Senão, a gente resolve o problema com o governador, com quem está construindo a obra, que é o Estado, mas não resolve com a população que é a interessada direta e a responsável por pagar o empréstimo, porque ele não é dado, é pago. Quem paga é a população brasileira, que nesse caso, mais especificamente, é a população do Estado do Ceará. Todas essas questões precisam ser levadas em conta, no tocante a grandes obras, por isso estamos empenhados.



Outro ponto importante para o Ceará é a busca por uma universidade federal no Cariri, uma região de mais de 1 milhão de habitantes, em três municípios praticamente temos essa população, é uma região muito importante e muito interessante para o resto do país conhecer e saber que existe também, num estado como o Ceará e mais ao norte de Pernambuco e Piauí, uma região de serra, de clima agradável, de capacidade produtiva, de população grande e que precisa de uma Universidade Federal, porque o Estado só não tem mais condições de bancar sozinho o ensino superior, que nem é de sua responsabilidade direta, mas da União Federal. O Ceará, proporcionalmente à sua população, é o estado que menos tem investimentos federais em ensino superior, tem apenas uma universidade federal, justamente localizada em Fortaleza e fora de lá, só tem os cursos de Medicina em Barbalhos e em Sobral.



O Ceará tem a boa fama de ser um bom captador de recursos federais, mas, ultimamente, esses recursos tem diminuído, o senhor acredita que isso é resultado de um momento histórico ou reflexo do velho problema do superávit primário?





Acredito que são os dois problemas. O governo foi além da conta no superávit primário, que é muito pesado para o Brasil e repercute em todos os Estados. Se você avaliar a curva em relação aos investimentos da União no Nordeste em geral e no Brasil, pode-se notar o decréscimo dos investimentos do orçamento geral da união. Em contrapartida, o Estado tem recebido aval para adquirir empréstimos nas agências federais. BNDES, CEF, Banco do Brasil e BNB, têm emprestado como nunca, não só ao Ceará, mas aos outros estados também. Viabilizou-se agora o Prodetur II, que já está praticamente fechado, os empréstimos devem ser entregues em breve, então temos agilizado esses projetos. É importante ressaltar, inclusive, que o BNB saiu de um investimento de R$ 250 milhões, no final do governo FHC, com o FNE dentro do Banco do Nordeste. O dinheiro do FNE terminava tesourado no Banco Central, porque não era usado no BNB, não servia para o que ele estava determinado pela Constituição. Esses recursos tinham que ser aplicados. Agora já chegamos à seguinte situação: em 2003 já foi para uma aplicação de R$ 1,3 bilhão, em 2004, R$ 3 bilhões e em 2005 nós poderemos superar a marca dos R$ 4 bilhões. Se tivermos os tomadores desses empréstimos, com as garantias, a marca de investimentos será superada.





De maneira geral o estado do Ceará tem buscado atrair esse dinheiro, claro que é um recurso distribuído no Nordeste inteiro, mas o Ceará tem trabalhado muito nessa questão porque desse ponto de vista administrativo o Estado apresentou um conjunto grande de projetos, que se viabilizaram ao longo do tempo, embora não estejam demandando recursos dentro do orçamento geral da União. É o caso do Porto do Pecen , que até hoje recebe emendas de Bancada e o governo tem que mandar dinheiro para ampliar o complexo e a infra-estrutura toda. O governo conseguiu resolver um problema que vinha se arrastando há muito tempo, que é o caso da siderúrgica. No Ceará ela várias obras já foram inauguradas sem estar prontas, uma siderúrgica, refinaria, o Castanhal, em campanhas eleitorais são apresentadas como obras prontas, mas que nunca tinham sido feitas. Agora, a siderúrgica, uma obra do Estado do Ceará, importante para o estado, que tem investimentos privados, por meio de duas empresas estrangeiras, uma coreana e uma italiana, e que conta com a participação do BNDES, por meio do BNDSPA, do BNB, e do Gás da Petrobrás, finalmente está sendo considerada federal. Esse é um empreendimento muito importante para o Estado, mas que é, basicamente, federal. Agora esse empreendimento tem sido viabilizado pelo esforço, inteligência do governo com a participação da Bancada Federal que está pressionando o governo a apoiar esta iniciativa que é importantíssima pro estado, ninguém tem dúvidas. Não importa para nós qual governo vai inaugurar a obra, se é o do Lúcio Alcântara, ótimo, se for no nosso, melhor ainda, o interesse é que ela esteja pronta e materializada.



Nem sempre investimentos em estrutura significam diretamente melhoria no desenvolvimento urbano, prova disso são estados do Nordeste que contam com poucos investimentos, mas tiveram melhoria considerável no IDH nos últimos anos. Como o senhor analisa a necessidade de se criar uma sintonia entre a realização de grandes obras de infra-estrutura, em contrapartida com o povo que continua muito pobre?



Esse é um dilema nacional. Nós vivemos espasmos no Brasil, hora um estado melhora um pouco o IDH, pouco depois apresenta uma queda. Na verdade o problema é que o país não tem uma política de distribuição de renda mais forte, porque programas sociais não são a única forma de distribuição de renda. Eles são fundamentais, o bolsa-família, o crédito subsidiado, mas o programa de distribuição de renda mais forte é você distribuir espacialmente o desenvolvimento industrial, agrícola, é apostar em determinados setores da economia que podem gerar muitos empregos. Por exemplo, como não tem um plano nacional de desenvolvimento industrial, os Estados disputam as indústrias como podem. O Ceará puxou o setor calçadista, levou para Sobral a Grendene com a geração de 17 mil postos de trabalho. Para Sobral foi uma evolução, mudou o IDH total da cidade, mudou a infra-estrutura, mudou tudo. Se você comparar com Limoeiro do Norte, que era conhecido nacional e internacionalmente como o município das bicicletas, hoje Sobral tem muito mais bicicletas, a cidade inteira é cortada por bicicletas, porque o povo mudou a sua renda, melhorou a qualidade de vida. O desenvolvimento industrial garantiu a geração de empregos, o desenvolvimento econômico. Esse esforço tem que levar em conta governos locais, estaduais e governo federal.



Eu digo, sem receio de cometer um erro, o governo federal ainda não conseguiu, nem no nosso, nem nos outros governos, ter um plano de desenvolvimento industrial para o Brasil, respeitando esse problema do desequilíbrio regional. Em função de que os Estados mais desenvolvidos, o chamado triângulo São Paulo – Rio – Minas Gerais, têm muita força e sempre que se pensa em um projeto nacional, em se deslocar o volume industrial para o Ceará, Paraíba e norte de Pernambuco, eles impedem. Isso atrairia o desenvolvimento e o progresso para a região. Eu imagino o que seria, por exemplo, do Centro-Oeste sem Brasília. O que estendeu as fronteiras agrícolas do país para esta região foi uma visão forte e de estadista do Kubitschek, que terminou o governo dele com um mar de lama, foi eleito o homem da vassoura, mas até hoje ele é consagrado como um grande presidente da República. Mas o que foi feito com ele foi isso, foi ser chamado de presidente de um mar de lama, porque construiu Brasília. E eu posso dizer, vendo a história, porque não a vivi, que esse foi um grande acerto, um grande êxito.



Mas nós vivemos isso, temos espasmos, então o Rio Grande do Norte melhora seu IDH, mas de repente despenca. O Ceará, tem liderado os índices, caiu a mortalidade infantil, nos últimos 10, 15 anos, o numero de crianças em sala de aula também aumentou, o que é favorável pro Brasil inteiro. Mas, ao mesmo tempo, falta qualidade nas escolas, os professores ganham muito mal, temos municípios que pagam menos de um salário mínimo para seus professores. Então, ainda temos dramas sociais terríveis que atrapalham a melhoria da qualidade de vida do povo, nestes estados do Nordeste Brasileiro, onde está inserido o Ceará que tem ainda a peculiaridade de estar em cima de uma pedra. Mais de 70%% do território está em cima de uma pedra então é muito mais dramático do que os demais, mas ali se vive também.



Qual é a sua opinião acerca da agenda mínima de governabilidade proposta pela CNI e apresentada aos deputados nordestinos em um café da manhã esta semana?





A reunião com a CNI foi um grande acerto da Bancada do Nordeste, através do seu coordenador, que levou para a reunião o presidente do Congresso Nacional, e da prórpia CNI que tem à sua frente também um nordestino e isso ajuda muito a nossa discussão dos temas que estão em tramitação no Congresso Nacional em uma situação crítica. A situação é do Congresso Nacional, não é só da Câmara Federal. O Senado também não funciona e, apesar de ser uma Casa muito mais conservadora e reacionária, o Senado está adorando este clima de confusão generalizada, fazendo um verdadeiro palco eleitoral do PFL e PSDB nesse momento de crise. A CNI, ao propor a discussão de temas, entre eles o tema do saneamento, que é o que mais tem impacto na qualidade de vida e reflete no IDH de forma mais imediata do que qualquer outro, acertou. O saneamento tem impacto na qualidade de vida imediata, em vários sentidos, na saúde, renda, na captação de empreendimentos, porque cidade que tem saneamento e esgoto conquista indústrias interessadas em levar suas empresas pra lá. Agora, se não tem nem esgoto, ninguém quer pôr empresa lá. Água, esgotamento sanitário, macro-drenagem, recuperação de rios e riachos, essa é a previsão do saneamento ambiental hoje e são projetos que têm recursos. O governo tem disponibilizado recursos, a situação é tão dramática que você tem os recursos do Fundo de Garantia, que são obrigatoriamente para habitação e saneamento, mas para pegar o dinheiro e fazer investimentos nessa área, todo governante, seja prefeito ou governador do Estado, que detêm as maiores empresas de saneamento do país, ainda tem muito receio de pegar os recursos, porque são muito caros, mesmo com garantias, pela regulamentação e por diversos fatores. Por isso essa matéria precisa ser tratada, discutida e votada. Tem matérias que tratam do assunto já há muito tempo na Câmara, um projeto da deputada Maria do Carmo, de Minas Gerais, que está apensado ao projeto do governo. Já há um certo consenso em torno da matéria proposta pelo governo, mas é evidente que uma matéria que recebeu mais de 800 emendas não terá facilidade de tramitar. Por isso o governo foi até obrigado a retirar a urgência constitucional da proposta.





O fato é que a CNI e os empresários têm consciência de que esse é um projeto impactante, que mexe com qualidade de vida, geração de empregos, facilitação de empreendimentos e mexe com as empresas brasileiras da construção civil todas, todos os setores. Agora o Congresso Nacional precisa, já que tem um conjunto de matérias grande para ser analisado, se esforçar para votar tudo. Acerca das propostas da CNI, existe a reforma tributária, mas eles não estão interessados, porque a parte que interessava para eles já foi feita. Ainda mais com a MP do Bem, aí sim que eles estão satisfeitíssimos com a questão tributária, mas ela ainda precisa ser votada. Aqui no Congresso, o que pega é a questão dos Estados e Municípios, mas no restante eles estão satisfeitíssimos. Ter a inflação sob controle é bom pra eles, é bom pro povo, para todo mundo. Os juros altos precisam cair e já começou, ainda que muito pouquinho. E essa questão do saneamento permitiria um salto razoável no país. Agora depende da sociedade e do Congresso Nacional. Se nós conseguíssemos colocar, em meio a essa crise, uma proposta importante como essa em votação, de fato quebraríamos esse ritmo de crise. Uma matéria desse porte para ser discutida e votada no Plenário da Câmara, para depois ir ao Senado, conseguiríamos realizar reuniões frutíferas. Para isso é preciso o empenho de parlamentares e senadores, com o apoio do empresariado nacional para esta questão-chave, que impacta especialmente a população mais pobre, que é quem mais precisa de saneamento.





Como representante de um partido de esquerda, de governo, como o senhor analisa a possibilidade de partidos do governo serem colocados de lado durante um possível processo de eleição para substituir o deputado Severino Cavalcanti na presidência, já que a saída dele agora é iminente?





Na verdade nosso partido tem consciência da insustentabilidade política do presidente da Câmara diante de todas essas denúncias, mas eu acho que todos os partidos têm que ter consciência também que o presidente não é um parlamentar qualquer, é o presidente do Poder, e tem direito a apresentar a sua defesa de forma ampla, aberta, antes de qualquer decisão. Embora politicamente já tenhamos certeza de que a situação é insustentável. Na verdade, no mínimo, diante das denúncias, ele teria de se afastar. Mas nós sabemos qual é o rito da crise política, ele é praticamente sumário, à medida que ele se afaste, ele estará praticamente condenado para a opinião pública, restaria apenas ser condenado pelo Conselho de Ética e, depois, pelo voto aqui da Câmara. Então, o mais ajustado politicamente, na opinião do PCdoB, é esperar. Até porque nunca fomos um partido que faz apologia da condenação, nunca fomos correndo condenar deputado A, B, C ou D. Eu vejo vário deputados subindo na tribuna e fazendo apologia porque um deputado foi cassado, mas a cassação de um deputado ou senador é um momento de tristeza para o parlamento brasileiro e do cenário político nacional. Todo mundo fica impactado com aquela cena de você cassar um deputado que não se conduziu adequadamente com os seus eleitores e com o seu país.





Então não fazemos apologia, temos sido ponderados nessa questão até porque já sofremos um processo de cassação da Bancada inteira, o PCdoB todo já foi cassado. Então sabemos muito bem o que é o jogo, a batalha da luta de classes que alguns acreditam que não existe mais, mas ela existe sim e é ferrenha, com muita força hoje ainda no cenário político nacional, esse é o momento dela. NO episódio do Severino isso é claro, mas o PCdoB não quer isso, quer a ponderação e não o assoreamento, porque o que os partidos fizeram, o PFL, o PSDB, foi eleger o Severino, antes de mais nada. Ele só foi eleito graças aos partidos de oposição que queriam derrotar o governo e agora, diante desse episódio, a primeira coisa que eles fizeram foi correr rápido, para se apresentar à opinião pública, aos veículos de comunicação, à mídia, como se eles fossem os donos da saída honrosa do Parlamento nacional, da Câmara dos Deputados. Eles não estavam preocupados com a moral e com a ética, mas em serem “pais” da solução para a crise, mandando o presidente da Câmara para o Conselho de Ética imediatamente. Não estavam preocupados com a ética, mas com o bem político-eleitoral, esse sempre foi o principal foco da oposição. Mas foi ela quem colocou o Severino para presidir a Câmara e nós sabemos que ele, a despeito da sua trajetória de parlamentar, os seus depoimentos públicos sempre deixaram claro que ele não tinha condições efetivas de dirigir a Câmara dos Deputados. Mesmo assim, essa oposição, irresponsavelmente, votou, apoiou, sustentou e só deixou de sustentar quando achou que ele estava mudando de lado. Porque aí ele já não era mais aquela figura que mesmo folclórica e pitoresca, até mesmo engraçada, necessária para os desejos da oposição. Aí eles correram rapidamente pensando: “nós elegemos, nós vamos tirar e ganhamos o apoio da base do governo”.



Mas nós decidimos examinar antes, não vimos necessidade de correr e estamos examinando, vamos ver como vai transcorrer esta questão daqui até o pronunciamento do presidente que deve decidir se enfrenta o Conselho de Ética ou se vai renunciar, porque nesse caso não será a renuncia à presidência da Câmara, mas a seu mandato de parlamentar. Os partidos da base do governo, a rigor são os que estão mais preparados para assumir a presidência no caso de uma nova eleição, atendendo ao critério de ser o partido que tem maior número de deputados, que é o PT, de ter uma forte bancada da base aliada. Acho que esses partidos podem, tranquilamente buscar uma alternativa para vencer a eleição. O que não pode ocorrer é o que ocorreu na eleição, à época, do presidente Severino, e que desencadeou parte dessa crise, que é o principal partido da base partir com dois candidatos. Isso não pode existir, a base de governo tem que ter um único candidato e apresentá-lo não pelo segmento de maior partido da base de governo, não tem que ser obrigatoriamente do maior partido, mas temos que buscar uma alternativa que seja unitária para a base de governo e que, ao mesmo tempo, responda à oposição, que atraia setores importantes da oposição também. Lógico que numa crise não existe um nome acabado, pronto, que atenda à todos, que seja capaz de unir a base e setores da oposição, mas temos que vislumbrar este caminho, alguém que una o governo e parte da oposição. Acredito que não temos como unir toda a oposição, mas ao menos uma parte dela, temos condição, sim, de ter uma candidatura forte que pense no Congresso Nacional, na Câmara dos Deputados, como uma representação popular e não apenas como base de governo ou oposição.





No Brasil as eleições começam um ano antes e agora, mais do que nunca, está claro que os quadros eleitorais estão começando a se delinear, como o senhor avalia o futuro do PCdoB, historicamente um aliado do PT, frente a essa crise e ao iminente processo eleitoral?





Nesses últimos dois anos, desde as últimas eleições até agora, o PCdoB tem crescido bastante. É um partido que sempre trabalhou no processo de alianças políticas compreendendo bem a realidade e que caminhos adotar para fazer o país avançar um pouco mais sempre, planejando sempre acumular o máximo de forças para chegar ao nosso objetivo maior que é chegar à construção de uma sociedade socialista. Esse é o maior desejo do PCdoB e várias pesquisas mostrar que o povo brasileiro também deseja ter uma sociedade socialista, mais justa. O PCdoB tem buscado suas alianças para isso.

Para se ter uma idéia, nós apoiamos a candidatura do deputado Mauro Benevides para o governo do Estado, em 1982; e apoiamos o atual senador Tasso Jereissati para o governo em 1986, porque as circunstancias políticas colocavam à nossa frente, esta opção como a mais acertada, como a mais progressista naquele momento para derrotar, digamos assim, o adversário central, principal do Brasil, do povo brasileiro e do povo cearense. Tanto que em 1989 a gente apoiou o Lula e seguidamente até a sua eleição em 2002. Mas fizemos também várias alianças no Estado e nos Estados. O Piauí e o Pará são exemplos de alianças variadíssimas, sempre levando em conta os interesses da nossa população e do nosso partido. Nesse processo, nos últimos anos, nosso partido cresceu bastante, embora isso não signifique, muitas vezes, eleição. Porque a gente concentra muito na eleição proporcional, mas as lideranças se apresentam nas eleições majoritárias. Você transforma quadros políticos preparados em quadros reconhecidos pelo povo na eleição majoritária. A proporcional é sempre mais difícil. Como quase nunca apresentamos candidatos a governador, presidente, ficamos com a fama de não ser um partido que quer o poder, porque estávamos buscando a aliança, para alcançar aquele objetivo de abrir caminho para os nossos ideais. Isso deixou o PCdoB numa situação mais difícil para uma próxima eleição, porque crescemos muito, mas não tínhamos essas grandes lideranças em cada estado, em cada município importante, porque estávamos na eleição proporcional. Já o PT fez outra marca, a da eleição majoritária, ele enfrentou as grandes eleições, ainda que para perder, para montar a sua liderança. O PT acabou conhecido como o partido que disputa a eleição e o poder naquela região, naquele estado, ou mesmo no plano nacional, como fez.





Então a nossa lógica é de que crescemos, mas isso não significou que não tivéssemos perdas, nós já perdemos deputados nessa crise e podemos perder outros. Mas se estamos perdendo é pela batalha, pelo convencimento político. Se ele não está mais convencido, ninguém vai forçá-lo a ficar num lugar que não o convence mais, não pode ser só uma conveniência, você tem que acreditar, se não acredita mais, não tem porque ficar ali. Por isso que eu digo, o que norteia o nosso partido é a política. E vemos agora, menos de um ano antes das eleições, que temos que manter nossa ideologia. Vamos buscar alianças, queríamos a federação de partidos aprovada, mas já reconhecemos que não tem clima para se aprovar nada de reforma política por agora, isso para nós permitiria uma garantia de sobrevivência um pouco maior, uma federação de partidos que incluísse a PSB, o PCdoB e outros legendas que quisessem entrar. Lógico que exigiria um tempo de casamento um pouco maior, de uns três anos ao menos, algo que não tem como ocorrer. Mas foi o que o PCdoB decidiu, unir-se ao PSB, formar uma federação onde os dois têm sua identidade, mas estavam protegidos partidariamente, com horário de televisão para discutir partidos, programas e outros benefícios. Não teremos essa saída então temos que fazer um esforço muito maior no processo de eleição futuro, para eleger deputados federais e também para ocupar espaços na eleição majoritária. Mas nossos planos não mudaram. Queremos estar na eleição majoritária para o Ceará, Rio de Janeiro, onde tivermos lideranças, queremos esse espaço majoritários e também outros espaços proporcionais na Câmaras Federal e Legislativa. Nós temos que ocupar esses espaços e decidir as coisas pela política.



As eleições normalmente começam um ano antes, essa começou dois anos antes. Com a eminência do Lula ser eleito em primeiro turno, a oposição detonou a crise política a partir de março deste ano, com toda a força. Essa crise não foi obra do acaso, foi muito bem pensada, a direita age com muita força e se preparou para enfrentar o Lula no ano de 2005, não em 2006. Até porque se deixasse para o ano que vem, ia perder em primeiro turno, então tinha que enfrentá-lo este ano. Então esta batalha que estamos assistindo, três CPIs, tudo isso é uma forma de vencê-lo. Por isso é preciso que se apure, que se investigue, que os culpados sejam punidos, mas sem esquecer que tudo isso está ligado à batalha eleitoral de 2006. Essa é a política no Brasil, ela está em curso, está sendo disputada e o PCdoB está no bojo dela, não tem como fugir. Mas no bojo dela nós temos lado também, somo governo, mas somos críticos ao governo na sua política econômica, achamos que é um erro o superávit primário, o câmbio apreciado e juros estratosféricos é veneno puro para a economia, porque você pode ganhar no curto prazo e ser um desastre no médio e longo prazos. Nós não nos reunimos com o Lula só para dizer que está tudo bem, nós temos deixado nossa posição clara quanto à política econômica, sempre mostrando que, na nossa opinião, esse caminho não é bom para a economia do país e para o desenvolvimento da nação, que é o grande objetivo de qualquer governo. A intenção do PCdoB é corrigir esse rumo, não sabemos nem se o Lula será candidato a presidente, mas estamos dando nossa opinião.





O partido está se preparando. Se o Lula for candidato à presidente, nós examinaremos, mas sempre olhando todas as opções possíveis. Caso nenhuma das opções seja favorável ao caminho que traçamos de acumular forças no nosso país, com nossos objetivos, talvez sejamos obrigados a ter o nosso candidato próprio. Ele não vai ganhar para presidente da República, mas vai se apresentar mais claramente para o povo brasileiro com as suas opiniões. Ainda assim, nós preferimos uma aliança que contemple melhor o nosso programa, que é desenvolvimentista, nacional, de soberania, de maior aliança na América do Sul. Essa aliança talvez tenha sido o maior problema que o Lula enfrenta. O êxito dele com a política externa e com o fortalecimento das relações com a América do Sul, em não ter deixado a ALCA prosperar do jeito que os americanos queriam, em ter saído do acordo com o FMI mesmo aplicando uma economia ortodoxa, e de, existindo seu governo, estabilizar a situação política na América do Sul. O Lula facilita pra Chàvez, fortalece Cuba, facilita para o Kishner, para Vasquez, propicia uma vitória para o Morales no próximo ano, enfim, o conjunto da esquerda na América do Sul ganha com o Lula e é exatamente por isso, talvez, que o presidente seja indesejável para certos setores da direita internamente e fora do Brasil, também.







( por Alessandra Flach com a coordenação de Genésio Araújo Junior)

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