Especial de Fim de Semana.
Parlamentares apoiam decisão de coordenador da Bancada do Nordeste em definir agenda positiva para projetos que beneficiem a região; Deputados da Bahia, Ceará, Pernambuco e Sergipe sugerem ações mais efetivas para Bancada ter força no Congresso, listam projetos que consideram prioritários e concordam que região sudeste recebe mais recursos que o Nordeste.

( Brasília-DF, 26/08/2005) A Bancada do Nordeste tem se reunido tradicionalmente às quartas para discutir temas de interesse para a região. Nos últimos encontros, no entanto, a presença dos deputados nordestinos está cada vez mais escassa, o que levou o coordenador da Bancada, deputado B. Sá (PSB-PI), a cobrar, na última reunião na quarta-feira, 23, a participação dos parlamentares nos encontros. O parlamentar anunciou a decisão de reunir a Bancada para definir uma agenda mínima contendo projetos de interesse para o Nordeste, a serem defendidos pelo grupo de parlamentares no Congresso. “Vamos reunir os parlamentares e definir projetos que já estão na pauta de votação e que são importantes para o Nordeste”, afirmou.





A Política Real procurou alguns deputados para saber o que eles pensam da construção de uma agenda positiva para a região e que propostas, na opinião deles, deveriam fazer parte dessa agenda. A opinião de que a Bancada tem força suficiente para garantir a aprovação de medidas indispensáveis para a melhoria na qualidade de vida no Nordeste foi unânime. Todos os parlamentares acreditam que existem propostas que podem, sim, unificar a bancada e garantir unidade na votação e aprovação de projetos benéficos para o Nordeste.





Para o deputado José Carlos Machado (PFL-SE), coordenador da Bancada do Sergipe, a unificação do discurso da Bancada é importante para que se consiga algo de concreto do governo. “O que temos notado é que o Nordeste é prioritário no discurso do governo, mas na prática não acontece absolutamente nada e nós não temos sido competentes dentro da Bancada, para reverter esse quadro”, afirmou. O parlamentar acredita que se forem definidos projetos importantes na lista de prioridades, a Bancada tem tudo para se unir pelo nordeste.





O deputado Antônio Cambraia (PSDB-CE), que já foi prefeito de Fortaleza, também considera que a “bancada não tem usado a força que tem” para garantir recursos e melhorias para o Nordeste. “Por ser uma região grande, com certa disparidade entre os Estados, o Nordeste não é tão uniforme e isso se reflete na Bancada, onde cada parlamentar defende mais os interesses de seu Estado. Mas existem pontos em que pode, sim, ser estabelecida uma agenda positiva e são eles que devemos priorizar.” O tucano acredita que a força da Bancada só não é maior porque “não há uma coesão, um entrosamento entre as bancadas estaduais a ponto de defender o nordeste”.



Segundo Severiano Alves (PDT-BA), líder de seu Partido na Câmara dos Deputados, falta “motivação” para a bancada nordestina. “O governo peca, mas a inércia dele é resultado da falta de uma ação política coordenada. Pelo tamanho e importância que a bancada tem, deveríamos conseguir mais coisas para o nordeste. Temos tudo para fazer valer as ações que interessam ao Nordeste, tirando proveito, inclusive, do atual momento político”, disse.





Já o petista Fernando Ferro (PE), também líder de partido, acredita ser difícil quebrar o clima de “disputa” existente na bancada, mas não impossível. “Definir uma agenda mínima para o Nordeste é uma tarefa muito delicada, porque o que se verifica aqui na bancada é o reflexo da guerra fiscal nos Estados, das disputas por espaços políticos e pela partilha do bolo financeiro do país. Acho que é possível fazer isso a partir de iniciativas regionais, mas temos que buscar entender quais seriam essas ações, para criar grandes temas regionais como referência para a ação da bancada.” Na opinião do líder, a bancada precisará definir claramente seus objetivos para que, durante as votações, os discursos não se dispersem na hora de disputar recursos para a região. “Se não se criar claramente uma lista de objetivos comuns, regionais, uma agenda regional de fato e não essa pulverização de iniciativas, nunca vamos conseguir interferir, de maneira articulada, enquanto bancada regional”.





Sugestões



Os deputados deram sugestões para que a coordenação da Bancada estimule a união dos deputados em torno de objetivos específicos para a região. O líder do PDT, Severiano Alves, acredita que “se o coordenador não motivar os deputados, essa bancada vai desaparecer”. O parlamentar sugeriu que B. Sá chame a reunião para definir a agenda prioritária, mas que além das reuniões pela manhã para debater, também houvesse ação para resolver os problemas. “Esse negócio de trazer ministro pra dar palestra já está desgastado, temos que fazer a discussão entre nós e criar uma frente, um grupo que pressione ministérios e governos para liberar os projetos positivos para o Nordeste. Acho que assim a Bancada funcionará melhor. Porque os debates com os ministérios só mostram dados e elogios, muitas vezes fantasiosos, mas que não dão resultado.”



José Carlos Machado acredita que “não adianta nada trazer ministros que discursam, mostram dados, prometem recursos, porque o governo não cumpre. As reuniões devem ter um tema “apaixonante”, algo que una realmente a bancada a buscar resultados concretos”. Na opinião do deputado sergipano, os governadores de cada estado também deveriam se envolver na luta por melhorias no Nordeste.





Para o líder do PT, os parlamentares precisam parar de pensar apenas em seus Estados e começar a pensar no Nordeste como região e na bancada como regional. “Temos que evitar o que acontece nos debates da bancada, quando cada um trata exclusivamente do seu Estado, porque isso dispersa e, em alguns casos, cria uma cultura de disputa. A definição de uma pauta regional pode nos livrar dessa armadilha da disputa intra-região que termina se tornando um instrumento de desagregação da bancada”.



Projetos prioritários





Os deputados entrevistados foram unânimes com relação a algumas das propostas que, na opinião deles, devem ser priorizadas pela Bancada e pelo governo. A abertura da discussão sobre a recriação da Sudene, por exemplo, foi defendida por três dos quatro parlamentares. Para Severiano Alves, a questão foi “posta de lado e a bancada deveria fechar questão, exigir do governo que o valor orçamentário destinado para a recriação seja liberado e a implantação seja imediata”.





Já Fernando Ferro acredita que a discussão precisa ser reaberta para que se tenha certeza da “necessidade de um órgão de planejamento regional” e da “função real da nova Sudene”. Antônio Cambraia também defende a discussão do tema.





Outra unanimidade foi a questão do Fundo de Desenvolvimento Regional, que garantiria recursos para a região e está previsto na Reforma Tributária, que ainda não foi votada. Segundo Severiano Alves, “São Paulo e Goiás não gostaram de pontos da reforma e ela está parada prejudicando 25 estados que estariam interessados nesse fundo”.





José Carlos Machado acredita que a bancada deva lutar para assegurar os recursos do Fundo. “O governo afirmou que daria R$ 2 milhões em recursos para a região, não foi votado e agora ele já avisou que vai diminuir para R$ 1 milhão, não podemos admitir isso”. Já Fernando Ferro quer saber “como anda a distribuição de crédito pra região, como os bancos oficiais distribuem os recursos pra região e para o restante do país”.





Destinar recursos e maior atenção à duplicação da BR 101 e à Transnordestina foram pontos defendidos por Fernando Ferro e José Carlos Machado. Ambos entendem que obras de infra-estrutura são importantes para o desenvolvimento da região. “O governo anunciou que essa é uma obra prioritária, a BR corta todo o Nordeste, mas no meu estado tem um trechinho de 13 Km, que começou a ser feito há 10 anos e ainda não terminou, vamos cobrar do governo, vamos ver se sai, eu duvido”, disse Machado. Os dois deputados também consideram a discussão de investimentos no biodiesel, na cultura de mamona no semi-árido brasileiro um ponto importante.





Os deputados Fernando Ferro e Antônio Cambraia defendem, ainda, a discussão profunda sobre a refinaria de petróleo prevista para o Nordeste. Os Estados estão disputando sua instalação, mas o projeto pode beneficiar toda a região. “Cada Estado quer a refinaria, por isso a discussão é importante, para acabar com as divergências”, afirmou Cambraia.





Outras duas propostas defendidas por Cambraia são a repactuação das dívidas rurais, que já está tramitando na casa, resultado da luta da Bancada, e o estímulo ao turismo regional. “O incentivo ao aproveitamento do potencial turístico da região é um ponto em que o Nordeste poderia trabalhar em conjunto, porque potencial é bem maior quando você dá mais opções ao turista”, afirmou.





Transposição





Outra unanimidade, que na opinião de todos os parlamentares entrevistados, colabora para a manutenção de divergências dentro da Bancada é a transposição do São Francisco. Para o líder do PDT, a discussão tem que estar alinhada, para que a obra atenda a todos. “Sou favorável à revitalização do rio e o projeto do governo destina recursos para esta obra, mas acredito que as somas de recursos deveriam ser menos destoantes. Da maneira como está, 10% dos recursos são para a revitalização e 90% para o resto das obras, quando deveria ser meio a meio, ou ao menos 30% para a revitalização”, disse Severiano. O deputado concorda que o projeto é polêmico, mas acredita que a Bancada pode chegar a um consenso. “Bancada e governo precisam conversar para ficar claro quem é a favor e quem é contra, para se chegar a uma decisão de maioria e respeitar essa decisão”, defendeu.





José Carlos Machado é mais enfático ao afirmar que o governo deveria parar com essa “sandice de tentar iniciar as obras do São Francisco sem haver um consenso entre os Estados que detém as bacias doadoras e receptoras. A Bahia é contra, Sergipe é contra, Pernambuco está em cima do muro, então é uma obra que divide a região e precisa ser discutida”.





Na opinião do petista Fernando Ferro, apesar das divergências, as obras serão benéficas para o nordeste como um todo e devem, sim, ser prioritárias. “Esse é um ponto de discórdia na bancada, mas que define uma questão de gestão de recursos hídricos de interesse da região. O debate deveria ser feito de maneira regional porque estamos brigando por água, sendo que toda a região tem problema de água. E não é que as águas sejam deste ou daquele estado, elas são do Nordeste”. O líder do PT acredita que “esse tipo de divergência debilita projetos bons como esse que deve injetar R$ 4,5 bilhões de recursos em obras de infra-estrutura e isso é importante para a região, só precisamos discutir as compensações”.





Distribuição de recursos





Os quatro parlamentares concordaram em outro ponto: a distribuição de recursos da parte do governo, para as regiões, não é democrática. Segundo Fernando Ferro, isso é uma questão histórica, na qual a bancada também pode interferir, mas contra a qual o governo Lula já está lutando. “O centro de gravidade política e econômica do país sempre foi a região sudeste, por isso ela tem adquirido recursos de forma desproporcional. Há que se pensar, sim, numa democratização dessa distribuição de recursos, algo que já começou a acontecer no governo Lula. Algumas ações de política do âmbito regional já tem sido feitas e atraído mais recursos para a região.”





O deputado José Carlos Machado discorda do líder petista lembrando que “tudo que o Nordeste tenta só é conseguido à força, porque o governo não dá nada para a região, que sempre foi tratada com desdém”. Para Severiano Alves, o problema é mais sério ainda. “O governo não tem interesse em nada, não libera nada, nem emendas parlamentares, nem recursos para os estados, se o Nordeste sofre mais com isso é só porque sempre foi assim”.





Na opinião de Antônio Cambraia, o governo realmente não tem conseguido diminuir essa diferença entre as regiões. “A proporção de recursos enviados para a região é de 1, enquanto para o sul e sudeste é 100. Sempre foi assim. Por mais programas e discursos de diminuição das disparidades regionais, medidas até bem intencionadas do governo, na prática a gente vê que as disparidades só aumentam”.





Ao defender as iniciativas do governo, o líder do PT criticou políticos nordestinos da elite chamando de “cínica” a atitude de “usar o caráter de pobreza e miséria da região para arrecadar recursos dos quais se apropriam quando chegam à região e canalizam para aumentar a má distribuição de renda”.





( por Alessandra Flach)




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