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( Brasília-DF, 17/03/2006) Em entrevista especial o deputado Paulo Rubem Santiago (PT-PE) faz uma análise da política econômica do governo e comenta sobre o projeto da Lei Geral da Micro e Pequena Empresa e o processo de elaboração do Orçamento. O parlamentar, que está em seu primeiro mandato federal, é reconhecido no seu estado como atuante fiscalizador das administrações públicas.
Ao longo da entrevista o deputado analisa os benefícios e problemas do PLC 123/04. O projeto visa unificar nove impostos e contribuições, aliviando a carga tributária das micros e pequenas empresas. A lei vai repercutir principalmente nos estados e municípios mais pobres, muito recorrente no Nordeste, que tem economia voltada para setor de serviços e comércio.
O deputado Paulo Rubem acredita que a implantação desta nova lei pode estimular a formalização dos contratos de trabalho, mas admite ser preciso um estudo para saber o impacto dos benefícios do projeto na arrecadação estaduais e municipais. “Alguns municípios nordestinos não têm receitas próprias, e dependem sobretudo das transferências do ICMS estadual ou dos fundos de participação”, diz.
Como membro da Comissão Mista de Orçamento o parlamentar critica a forma como o orçamento é elaborado e discutido. Paulo Rubem Santiago discorda da Lei que impede o Congresso de alterar a destinação de recursos do Tesouro para pagamento de serviços de dívidas e defende democratização da discussão de Orçamento. “Se não mobilizarmos a sociedade a Comissão de Orçamento continuará vítima dessas pressões de interesses de grupos privilegiados”, afirma.
Por fim, o deputado avalia a atual política econômica do governo como um erro do governo Lula, destoando do discurso de inclusão social. “No varejo o governo tem bons programas mas no atacado os valores transferidos para os setores mais ricos são 50 vezes maiores do que o que aplicado na área social”, argumenta Paulo Rubem Santiago.
Política Real :Como você avalia o projeto da Lei Geral da Micro e Pequena Empresa que vem sendo discutida pelo plenário da Câmara?
PRS: Há um consenso das comissões econômicas aqui da câmara, sobretudo na Comissão de Finanças e Tributação, de que a estrutura tributária (cobrança de impostos e contribuições), é extremamente pesada para a micro e pequena empresa. A carga tributária que incide sobre as empresas comerciais e setor de serviços termina fazendo com se trate com muito mais rigor as pequenas e médias e de forma muito mais branda as empresas maiores. Portanto a intenção de aprovar a Lei geral de pequenas e médias Empresas vem no sentido de tratar de maneira desigual aos que são desiguais. Nós sabemos que nos estados mais pobres a oportunidade de emprego nas atividades comerciais é muito restrita. Há um grande contingente de micros e pequenas empresas entre aquelas que desenvolvem atividades econômicas e oferecem ofertas de emprego e que movimentam a economia sobretudo das pequenas e médias cidades. É preciso, também, atentarmos que no país mais da metade das cidades têm menos de 50 mil habitantes, onde os postos de empregos são extremamente disputados pelo trabalhadores. Por isso que a Lei geral da micro e pequena empresa faz uma tentativa de tratar de maneira desigual a realidade desigual dessas empresas. Ou seja, há uma modificação generalizada da incidência de impostos e contribuições, há uma transferência de contribuição para previdência da folha do salário para o faturamento das empresas. Isto pode significar um estímulo a formalização dos contratos de trabalho e assinatura de carteira de trabalho.Hoje você incide a contribuição sobre a folha desestimulando as empresas a registrarem todos os seus empregados, porque a contribuição passa a ser sobre esta folha registrada. Se você transfere para o faturamento, mesmo que isso possa representar uma redução de arrecadação do recolhimento para a previdência, mas representa a desoneração da folha da incidência da contribuição previdenciária. Então há um estimulo a formalização do trabalho e ao registro dos postos de trabalho das micros e pequenas empresas. Há outras medidas importantes, referentes a compra governamental. É muito difícil para uma pequena empresa, com faturamento abaixo de um milhão de reais competir com os grandes atacadistas na venda de suprimentos para os órgãos governamentais. A proposta, portanto, também incentiva a formação de consórcios, que poderão ser constituídos por diversas empresas e juntas poderão disputar licitações. Como por exemplo, para compra de material escolar, compra de alimento destinado para merenda escolar, compra de material médico cirúrgico utilizados nos postos de saúde. Isto cria maiores campos de competição entre as grandes empresas, que detêm o monopólio do oferecimento de alguns insumos, e as micros e pequenas empresas que poderão ter chances de concorrer nas compras governamentais.
Política Real : Existe algum problema nessa lei?
PRS: Há controvérsias em relação às alterações propostas na fiscalização da justiça do trabalho, na contribuição de recolhimento para os fundos de garantia. Mas eu acredito que em função de não haver unanimidade na própria bancada do PT, tudo aquilo que não estiver vinculado a área fiscal e tributária seja destacado do projeto. Nós devemos discutir se estas medidas, para facilitar a vida das micro e pequenas empresas, são discutidas agora ou quando vier a reforma da Lei Trabalhista ou da Reforma Sindical. A proposta da Lei Geral é objetiva, e pode trazer para formalidade um grande contingente de empregos. Assim, com a redução do encargo tributário e a unificação de todos os impostos possíveis que incide numa empresa comercial de micro e pequeno porte em torno de uma única alíquota, você vai deixar de recolher impostos e contribuições que podem custar 30 % de ônus para empresa e recolhimento será unificado numa alíquota muito menor, que pode chegar até 4 %. Uma chance da empresa faturar, formar patrimônio e pode se qualificar. As faixas de incidência da tributação foram bastante fatiadas para que não haja disparidade entre a menor faixa e a maior como ocorre no imposto de renda. E você vai tendo assim um enquadramento mais brando, progressivo. Não haverá uma mudança brusca da incidência acompanhando o faturamento progressivo da empresa, por exemplo, que sai com faturamento de 50 mil reais por ano e passa para 100 mil.
Políticxa Real: Mas essa Lei não representa uma perda de arrecadação dos estados mais pobres, como é o caso da região Nordeste?
PRS: Uma pesquisa feita pela fundação Getúlio Vargas constatou que 75 % do ICMS arrecadado pelos estados são daqueles setores onde o ICMS é recolhido através da antecipação ou da substituição tributaria. Hoje o ICMS está concentrado na arrecadação do setor da energia, contas telefônicas, setor de bebida e do setor de combustível. Mesmo reconhecendo que esses setores representam a maior parte da arrecadação o comércio varejista tem ainda uma grande participação, sobretudo nas cidades de médio porte. Esse comércio varejista não pode ser menosprezado. O deputado José Pimentel (PT-CE), relator informal do projeto na bancada do PT, estimou em apenas 5 % o volume de recitas do ICMS que seria pulverizado com a redução dessas alíquotas. Eu argumentei, por exemplo, que no setor de alimentos no varejo, no setor da movelaria, no setor das lojas de pequeno porte do comércio eletro-eletronico, nós temos uma elevada carga tributária. Uma garrafa de cerveja vendida no mercadinho do bairro, e foi comprada na distribuidora com nota, constitui um crédito para o dono daquele mercadinho. O consumidor paga 25 % de ICMS numa garrafa de cerveja. Como paga também ICMS numa indústria moveleira, uma loja de eletrodomésticos. O ICMS é um imposto regressivo, ele tem a mesma alíquota independente do nível de renda de quem compra aquela mercadoria. Mesmo reconhecendo que hoje o ICMS se concentra nesses grandes setores intensivos, tanto na arrecadação como no consumo eu considero que não é de todo justificável que mantenha essa redução linear de todas as alíquotas para uma única alíquota. No caso do ICMS, as empresas comerciais não são de fato pagadores, são repassadoras de ICMS para o seu consumidor final, descontado o crédito que essas empresas já tiveram ao comprar, por exemplo, numa movelaria, a madeira, o verniz, o prego. Tudo que foi comprado antes, com nota, ali se constituiu o crédito de ICMS. Quando você, portanto, permite que uma empresa venda um produto cobra do consumidor 17 % e reduz para um imposto de 4,6 % você está transferindo dinheiro da sociedade para os pequenos empresários. Eu entendo que isso possa trazer alguns prejuízos, sobretudo para aqueles municípios com uma economia comercial representativa, mas que não tem em suas sedes grandes supermercados. Cidades com menos de 100 mil habitantes têm pequeno centro comercial. Este estudo não foi apresentado, sem que se possa estimar corretamente quanto o município perderia por diminuição da receita no estado. Temos que averiguar isso, porque muitas cidades do Nordeste não tem grande consumo de energia, de bebida, de combustível. Cidades que dependem da cota de repasses do ICMS estadual. E cada vez que essa receita diminui, diminui também a arrecadação das cotas de município.Portanto precisaríamos de uma tabela que pudesse traçar o perfil do impacto fiscal dos benefícios da Lei geral da pequena e micro empresa para esses municípios que não tem receitas próprias, e dependem sobretudo das transferências do ICMS estadual ou dos fundos de participação.
Política Real : Como um dos membros da Comissão Mista de Orçamento qual a sua avaliação do processo de elaboração da proposta orçamentária?
PRS: Eu avalio que o processo orçamentário no Brasil precisa de mudanças profundas e urgentes. Nós não conseguimos, nos quatro anos do governo Lula, criar nenhuma nova abordagem para que o orçamento possa ser debatido como deve ser. Ou seja, a organização das receitas para que sejam transformadas em despesas que tenham retorno efetivo na melhoria das condições de vida da população. A matéria orçamentária é extremamente fechada. Não se conhece, nesse quatro anos de governo, nenhuma iniciativa na aproximação do governo com a população e sociedade civil para discutir orçamento, seja com publicação de cartilhas ou implantação de outros processos. O orçamento é discutido de forma fechada, recebe as mais diferentes pressões de parlamentares da Câmara e do Senado, que representam interesses de grandes grupos empresariais, sobretudo grupos que tem contratos com o estado. A construção de rodovias, de usina hidroelétrica, a duplicação de rodovia, construção de barragens são por exemplo obras de grande porte, acima de 30 milhões de reais e que muitas vezes são interrompidas por dificuldades na transferência regular de recursos do orçamento por órgãos do estado responsáveis por essas obras. Nós temos o exemplo do escândalo do TRT de São Paulo, que tinha a frente o Juiz Nicolau de Santos Neto e que inexplicavelmente, uma obra como aquela amplamente superfaturada conseguiu por ano ter recursos liberados sem que qualquer órgão da Câmara, muito menos o Tribunal de Contas da União, tivesse a iniciativa e prontidão para impedir que aquele fluxo de recursos não chegasse a mais de 100 milhões de reais.
Política Real : Como melhorar esse processo?
PRS: É preciso uma proposta global para que o orçamento, desde o plano plurianual, a lei de diretrizes orçamentárias e a lei orçamentária anual, seja precedido de uma ampla mobilização nacional, com cartilhas, programas de televisão, propagando oficial do governo proclamando participação do povo para discussão. Se não mobilizarmos a sociedade a comissão de orçamento continuará vítima dessas pressões de interesses de grupos privilegiados junto ao estado ao presidente nacional. Além disso, as despesas relacionadas com os serviços de amortização das dívidas públicas são intocáveis, imutáveis. A Constituição de 1988, no código 186, parágrafo 3º, inciso 2º, letra b, proibiu o Congresso Nacional de alterar a destinação de recursos do tesouro para o pagamento de serviços da dívida. É como se o Congresso não tivesse autoridade para discutir o impacto da divida nas contas nacionais e as conseqüências deste impacto no financiamento das demais políticas de governo. Esta é a questão mais grave. Dívidas contratadas como se fossem despesas extraordinárias, completamente a margem ao controle a auditoria e avaliação.
Ou se rompe com o monopólio de tratar a comissão do orçamento como uma sessão simplesmente técnica ou teremos dificuldades de aproximar a elaboração do orçamento dos interesse populares, das participações da sociedade. O atraso da votação do orçamento deste ano, ainda não finalizada na segunda semana de março, é resultado das pressões de interesses de grupos privilegiados que pretendem retirar do tesouro maior percentual de recursos possíveis. Uma proposta que fiz, ao provável futuro presidente da Comissão de Orçamento, deputado Gilmar Machado (PT-MG) para que a TV Câmara produza um vídeo voltado especialmente para a matéria orçamentária. Uma espécie de programa educativo para conclamar a população a participar e debater o orçamento.
Política Real : O governo Lula endossa o discurso de políticas voltadas para inclusão social, você acha que a política econômica do governo está em consonância com a inclusão social?
PRS : Não, em linhas gerais, a política macro econômica, seus aspectos fiscais, monetários, cambiais a gestão da divida pública foi feita de forma errada. Ela tem comprometido o processo de crescimento e fortalecimento nacional. Na verdade o que acontece é que as desigualdades no Brasil elas estão tão gigantescas que qualquer passo no sentido de ataca-las é bem recebido. A situação é tão desigual que qualquer gota d’água irriga uma lavoura. Veja a conseqüência do programa Bolsa família, em que o governo federal conseguiu unificar os programas de assistência social concebidos no governo anterior.
Todos eles focados numa política de identificar os mais pobres, construir programas específicos. O Bolsa Família investe quase 9 bilhões de reais para assistência de 6 milhões de famílias. Mas em compensação você transfere algo em torno de 140 bilhões de reais com serviços da dívida pública para um universo microscópico de 4 milhões de pessoas, famílias mais ricas que tem excedente de renda e aplicam esse excedente em fundos de investimento, em fundos de pensão. Os próprios fundos de pensão investem o seu patrimônio em endividamento público. Os títulos de governo são assegurados pelo Tesouro Nacional. A priori, não há risco de não remunerar os títulos como a constituição e as leis determinam. Então é um excelente negócio. Por isso eu entendo que o governo Lula errou em não ter, ainda na primeira metade do seu governo, alterado em linhas gerais as regras da política macroeconômica. Não exerceu nenhuma pressão para que se fizesse uma auditoria, como recomenda a Constituição, no montante do estoque da dívida pública. Ainda mais se considerando que todos os contratos da dívida externa devem ser aprovados pelo Senado arquivados no próprio Senado.
Impressionante é notar que entre 1974 e 1998, de todos os contratos da divida externa considerados na contabilidade externa do país, só foram encontrados documentos de 28 % desses contratos. Foram computadas dívidas, mas não encontrados as clausulas contratuais referentes a essas dívidas constituídas. Há uma série de irregularidades na constituição das dívidas. Então a política econômica me parece estar errada. Há um excesso no tocante a fixação de metas de inflação de inflação que só são obtidas com baixo nível de crescimento. Conseqüentemente esse baixo nível de crescimento não tem respostas positivas na incorporação de jovens e adolescentes, para abertura de novos postos de trabalho, bem como para que o estado possa ter um papel indutor nas ações de infra-estrutura. As taxas de juros continuam sendo as maiores do mundo e não há paralelo onde se possa ter uma inflação entre 4,5 % e uma taxa de juro real de 12,5 %, como é o caso do Brasil. Então essa política econômica privilegia os mais privilegiados e é contraditória com a possibilidade de um modelo de ruptura. No varejo o governo tem bons programas, mas no atacado os valores transferidos para os setores mais ricos são 50 vezes maiores do que o que aplicado na área social.
( por Liana Gesteira com edição de Genésio Araújo Junior)